TDAH X DESEMPENHO ESCOLAR


O transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) repercute na vida da criança e do adolescente levando a prejuízos em múltiplas áreas, como a adaptação ao ambiente acadêmico, relações interpessoais e desempenho escolar (Arnold e Jensen, 1995; Barkley, 1996). .
As repercussões do mau desempenho escolar (MDE) na vida do aluno com TDAH, como necessidade de turmas especiais de apoio, sofrimento pessoal e familiar, bem como a influência na vida adulta, justificam o investimento no diagnóstico e manejo precoces do problema (Klein e Mannuzza, 1991).

Diante do exposto, o presente trabalho procura revisar os dados da literatura a respeito da relação entre desempenho escolar e TDAH.

 
 Desempenho escolar

  
 
O desempenho escolar depende de diferentes fatores: características da escola (físicas, pedagógicas, qualificação do professor), da família (nível de escolaridade dos pais, presença dos pais e interação dos pais com escola e deveres) e do próprio indivíduo (Araújo, 2002). Cumpre aqui ressaltar que a expressão “dificuldades de aprendizado” não é sinônimo de transtorno de aprendizado, termo reservado aos transtornos de leitura (dislexia), expressão escrita e da matemática (Semrud-Clickeman et al., 1992; Moojen et al., 2003).

Há grande dificuldade na definição de MDE, face aos inúmeros parâmetros utilizados para avaliar este fenômeno (Hinshaw, 1992a). Na literatura, encontram-se algumas medidas de desfecho para a avaliação do desempenho escolar, como alocação em turmas especiais, repetência, notas baixas, suspensão, pontuação abaixo do esperado para o coeficiente de inteligência (QI) em testes padronizados e baixo desempenho em termos absolutos (sem comparação com QI) em testes padronizados.

A dificuldade em se definir MDE foram ainda resumidas por McCall (1994) do seguinte modo: o indivíduo considerado portador de MDE não necessariamente tem notas ruins, ele apenas possui notas que não são tão boas quanto o esperado. De fato, há maior consenso em se considerar mau desempenho aquele substancialmente abaixo do esperado para as habilidades cognitivas do paciente (Hinshaw, 1992a; McCall, 1994).

A aferição do desempenho escolar impõe, inicialmente, que se defina uma área de interesse. Em seguida, deve-se levar em conta a comparação entre o desempenho escolar e o QI do aluno (Rutter e Yule, 1975). Considerando a leitura como domínio de estudo, isto pode ser feito de duas maneiras: (1) Comparando-se o desempenho em testes de leitura do aluno com aquele esperado para sua idade; ou (2) Comparando-se o desempenho em testes de leitura com aquele esperado para sua idade e QI. Nos dois casos, MDE é uma discrepância entre as duas medidas, porém, no segundo caso um aluno com inteligência normal ou acima da média poderia ter MDE, enquanto que, no primeiro caso, não.

Este modelo de análise de MDE pode ser útil para alunos mais velhos, porém, não faz sentido em alunos menores (Hinshaw 1992b). Por exemplo: como encontrar uma discrepância de um a dois anos entre o desempenho em testes padronizados e QI em alunos da primeira série se eles estão apenas no primeiro ano de estudo? Outra crítica a este modelo refere-se a questões estatísticas na medida de discrepância entre QI e desempenho acadêmico. Em primeiro lugar, um aluno com desempenho muito acima ou abaixo da média, em testes de desempenho acadêmico em uma primeira medida, tendem a ter desempenho semelhante à média em uma segunda medida, simplesmente devido ao efeito de regressão à média. Além disso, as fórmulas de discrepância tendem a superestimar MDE em alunos com QI alto e subestimar MDE em alunos com QI rebaixado. Por fim, as fórmulas de discrepância não levam em consideração o fato de que o aluno melhora seu desempenho em testes padronizados à medida que cresce, o que faz com que as discrepâncias entre QI e desempenho sejam mais comuns no aluno mais velho (Frick et al., 1991).

Assim, não se deve restringir a análise do MDE a uma discrepância entre desempenho em testes padronizados de cálculo e leitura e o QI. Ressalte-se que a maioria dos alunos com MDE não exibe um padrão de discrepância entre desempenho em testes padronizados e QI (Hinshaw, 1992b). Outros fatores devem ser levados em conta, como inclusão em classes especiais, expulsões, suspensões e notas baixas.

Entretanto, tais parâmetros são contaminados por englobarem aspectos de domínios diferentes. Por exemplo, expulsões e notas baixas estão associadas tanto ao comportamento hiperativo como ao desempenho escolar (Mantzicopoulos et al., 1989).

Inúmeros testes são utilizados para a aferição do desempenho acadêmico, entre eles: os subtestes de matemática e leitura do Basic Achievement Skills Individual Screener (BASIS) – (Psychological Corporation, 1983), o subteste de aritmética do Wide Range Achievement Test – Revised (WRAT) – (Jastak e Jastak, 1987) e o subteste de leitura do Woodcock Reading Mastery Test – Revised (Woodcock, 1987).

A prevalência de MDE varia nos diversos estudos dependendo do critério utilizado para o diagnóstico. Rutter et al. (1974) verificaram que a prevalência de MDE variava entre 7% e 20%, em diferentes regiões do Reino Unido, quando se utilizava como critério a presença de problemas de leitura, o que tornava o diagnóstico bastante abrangente. Já quando se utilizava como critério a presença de discrepância significativa entre QI e habilidades de leitura, a prevalência de MDE caía para 4% a 10%. Dados semelhantes foram descritos nos Estados Unidos (Taylor, 1989).

Em geral, a literatura mostra que há preponderância do sexo masculino sobre o feminino no que se refere ao número de casos de MDE, na proporção que varia de 2:1 a 3:1 (McCall, 1994). Os autores divergem sob a hipótese desta diferença ser de viés de amostragem (Shaywitz et al., 1990) ou se há uma real diferença entre os sexos (McCall et al., 1992).

Embora seja comum a crença de que o mau desempenho escolar esteja relacionado a pior nível socioeconômico, estudos que procuram utilizar amostras representativas demonstram que não há relação entre estas duas variáveis (McCall, 1994). Também há relatos de alunos com MDE com irmãos mais velhos apresentando bom rendimento, porém, não há estudos avaliando a posição na prole e MDE. O mesmo se pode dizer do binômio MDE/presença de divórcio em pais (McCall, 1994).

Curiosamente, apesar do MDE remontar ao aprendizado escolar, não há estudos sistemáticos investigando a relação entre MDE e as características de professores e da escola.

A presença de MDE é deletéria e custosa, tanto em termos financeiros – devido à necessidade de atenção especial para o aluno – quanto em termos pessoais – em virtude do sofrimento trazido para o aluno e para a família, levando, na vida adulta, à baixa auto-estima e dificuldades nas relações interpessoais (Horn et al., 1983; Spreen, 1988).

 



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